segunda-feira, 6 de junho de 2016

Nada te pertence



Uma das maiores dificuldades que, enquanto humanos, nos podemos deparar é o desapego. O desapego é abrir mão daquilo que cremos ser nosso, aquilo que cremos possuir alguns direito sobre. E isto aplica-se a múltiplas situações e vivências humanas. Desde as relacionais aos bens materiais. 

Dentro das relacionais começa desde logo pela relação que estabelecemos connosco próprios, com essa identidade que cremos ter. Essa ideia de personalidade que associamos um corpo, uma mente, e toda a história criada em torno dos mesmos. 

Na defesa de tal personalidade, o ser humano é capaz das maiores atrocidades, felizmente mais limitado as uns poucos, mas a maioria dos seres humanos numa escala mais pequena comete com regularidade atos que relegam para segundo plano os outros com vista a alavancar a sua personalidade, uma ideia de que nesta selva da vida apenas os mais fortes tem lugar.

O medo de perda dessa personalidade leva a uma defesa cerrada da mesma e quanto mais se procura defender essa ideia de personalidade o que ocorre é o reforço dessa prisão, uma limitação da experiência humana e um adiar de relembrar quem somos em essência.

Desapegando da idea de personalidade que cremos ser, aquilo que resultaria não seria o fim de nada, mas sim a libertação das amarras que impede o ser humano de "voar", de abrir as asas e vaguear na imensidão da existência nas suas possibilidades infinitas.

Dentro das relacionais temos também as relações amorosas, desde logo um conceito de amor baseado na necessidade do outro como sendo a outra metade, como sendo o elemento que completa a existência individual e sem a qual ficará sempre algo por completar. É este conceito que leva a muito sofrimento nas relações entre seres humanos.

O ser humano é pleno em essência e quanto mais ciente disso estiver mais livre fica para desfrutar de qualquer relacionamento sem se aprisionar na necessidade do outro, na dependência do outro para que este corresponda aos seus desejos, para que corresponda às expectativas que havia criado sobre o que essa pessoa deveria de ser e fazer.

O desapego é uma escolha de ser feliz, de estar mais conectado com a essência do que somos, e este estar mais conectado significa estar mais ciente do que se é, daquilo que é tal como é e não um qualquer processo de ligação, pois não nos podemos ligar a algo do qual nunca estivemos desligados, nem podemos estar.

As relações amorosas, de amizade e familiares melhoram muito através do desapego, pois ninguém é propriedade de ninguém, isto não implica que cada um faça o que lhe apeteça sem consideração pelos outros,porque deve-se sempre respeitar o outro, cuidar do outro, desse modo estaremos a cuidar de nós próprios também.

Seja qual for o grau de ligação entre dois seres humanos deve-se sempre respeitar a liberdade de cada um, respeitando os compromissos que se assumem, enquanto durarem esses relacionamentos, sejam eles eternos como a parentalidade, seja enquanto duram como as relações amorosas. As pessoas estarão juntas o tempo que for necessário para aprenderem o que tiverem de aprender e ensinar umas às outras e esse é o tempo perfeito.

Outro género de apego é aos bens materiais, estes são isso mesmo objetos, maiores ou menores, não são eles que validam a nossa existência humana, podem sim dar algum conforto, alguma segurança, mas para aquilo que somos em essência nada contam. 

Os bens materiais são usados como forma identitária também, como dando status a quem os tem ou diminuindo quem não os tem. Desapegando dos mesmos ficamos livres para valorizar o que é mais importante nesta experiência humana, que é o amor nas suas múltiplas manifestações. 

Na verdade sejam as relações, sejam os bens materiais, nesta experiência humana nada nos pertence, mesmo que exista um qualquer papel com o nosso nome que diga o contrário. 

Tudo nos é emprestado temporariamente, umas situações por mais tempo, outras por menos tempo, todas porém duram o tempo perfeito para completar o seu propósito. O desapego permite-nos ter essa consciência, relembrar que nada disso nos define ou condiciona a não ser que o permitamos. 

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